Maputo, Moçambique – Nas últimas décadas, o setor de mobilidade urbana em Moçambique tem sido palco de uma sucessão de promessas grandiloquentes, planos inacabados e projetos abandonados, sem que qualquer iniciativa de vulto consiga concretizar-se e transformar efetivamente o transporte nas grandes cidades. Apesar da manutenção histórica do mesmo partido no poder, a ausência de continuidade administrativa entre governos centrais e municipais tem perpetuado uma estagnação que penaliza a população e desperdiça recursos públicos, conforme constatado pelo Centro de Integridade Pública (CIP).
O Primeiro Metro de Superfície: Legado de Armando Guebuza
Em 2011, sob o segundo mandato do Presidente Armando Guebuza, o então Ministro dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula, anunciou a implementação de um sistema integrado de transporte para Maputo, inspirado em modelos europeus após visita à Itália. Um memorando de entendimento foi assinado com a empresa italiana Salsef Group para estudo de viabilidade do projeto, que previa metro de superfície, linhas de elétrico, BRT (Bus Rapid Transit) e infraestrutura dedicada a passageiros.
Contudo, em 2013, o Conselho de Ministros cancelou unilateralmente a parceria, alegando incompatibilidade financeira com a realidade nacional, provocando uma ação judicial da Salsef Group que reivindicava 100 milhões de euros em indenização. Após negociações, o Estado foi obrigado a pagar 6,5 milhões de dólares, equivalente a aproximadamente 410 milhões de meticais, sem que qualquer responsável fosse responsabilizado. O projeto, ainda hoje documentado no site da empresa italiana, permanece inerte, simbolizando uma das maiores oportunidades perdidas na história do transporte urbano moçambicano.
Filipe Nyusi e as Novas Promessas: Projetos de Ambição Sem Concretização
Durante o primeiro mandato do Presidente Filipe Nyusi (2015–2019), a gestão de Carlos Mesquita à frente dos Transportes trouxe propostas ousadas, incluindo a conversão de carcaças de autocarros em salas de aula e, posteriormente, o lançamento do AGT (Automated Guideway Transit), um sistema de transporte automatizado de passageiros. Previsto para o corredor Baixas-Zimpeto, com extensão de 18,1 km e capacidade diária para 112.000 passageiros, o projeto jamais saiu do papel.
No segundo mandato, o Presidente Nyusi indicou Jafar Abdulai, que revisitou a ideia do metro de superfície, e depois Mateus Magala, que prometeu uma linha férrea nacional ligando Rovuma a Maputo em cinco anos. Nenhuma destas iniciativas se materializou. Paralelamente, o projeto Futran, conduzido pela Empresa Municipal de Mobilidade e Estacionamento (EMME) de Maputo, prometia 50% das linhas operacionais até final de 2022, mas até hoje permanece estagnado, sem transparência sobre adjudicações, cronogramas ou financiamento, apesar de requerimentos formais baseados na Lei do Direito à Informação.
O Contraste Regional e a Inspiração para Novos Planos
Enquanto Moçambique permanece refém de projetos inconclusos, a Tanzânia inaugurou uma ferrovia elétrica de 2.560 km, ligando cidades internas e países vizinhos, com aquisição de comboios da Coreia do Sul e construção de infraestrutura moderna. Inspirado por este exemplo, o Presidente Daniel Chapo prometeu uma abordagem semelhante, priorizando inicialmente a descongestão do Grande Maputo, ligando Maputo, Matola e Marracuene, antes de sonhar com a integração nacional do transporte ferroviário.
Conclusão: Entre Sonhos e Realidade
O CIP conclui que Moçambique vive um déficit crónico de execução em mobilidade urbana, com perdas financeiras significativas e reiteradas promessas não cumpridas. Projetos como metro de superfície, BRT, AGT e Futran permanecem no imaginário coletivo, enquanto a população continua a depender de soluções precárias, aguardando que a retórica governamental se transforme, finalmente, em realidade tangível.
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